A Revolução Pernambucana de 1817
Indomável Pernambuco: Em meados de 1817, Pernambuco hasteou
sua nova bandeira declarando independência da coroa portuguesa. Instaurou-se um
governo republicano com nova constituição, baniram-se os impostos e concedidas
foram às liberdades de imprensa e religiosa. Dom João VI, enfurecido, despachou
exército e marinha que acabaram por sufocar a revolução que havia se alastrado
por todo o Nordeste. Todavia, os 75 dias de liberdade e igualdade perpetuaram
profundas marcas no espírito do povo pernambucano.
Bandeira da Revolução Pernambucana de 1817, cujas estrelas
representam Pernambuco, Paraíba e Ceará. Criada pelo Padre João Ribeiro de Melo
Montenegro, ela acabou por inspirar a atual bandeira do estado pernambucano que
é basicamente a mesma. Bandeira da Revolução Pernambucana de 1817, cujas
estrelas representam Pernambuco, Paraíba e Ceará. Criada pelo Padre João
Ribeiro de Melo Montenegro, ela acabou por inspirar a atual bandeira do estado
pernambucano que é basicamente a mesma.
No início do século XIX, mais precisamente em 23 de janeiro
de 1808 (há discórdia acerca desta data), Dom João VI e a família real
portuguesa — fugindo das tropas do déspota francês, Napoleão Bonaparte —
chegaram ao Brasil Colonial aportando na cidade de Salvador, na atual Bahia.
Consigo, a família real trouxe considerável parte de sua corte, algo estimado
em 15.000 pessoas. A inesperada chegada da corte ibera implicou em grandes
modificações para a então colônia, como, por exemplo, a abertura dos portos, em
28 de Janeiro de 1808, e a criação do Banco do Brasil, em 12 de outubro do
mesmo ano.
Entretanto, o clima de insatisfação para com o governo de
Dom João VI era quase geral, vista a carga tributária que cada vez mais se
elevava e a contraprestação do governo para com a população que era pouca ou
mesmo inexistente. Deixando a cidade de Salvador de lado, o Rio de Janeiro
passou por significativas mudanças, transformando-se no centro do império
lusitano, o que o fez receber gigantescas somas de capital das demais regiões.
Impostos abusivos foram instaurados para a manutenção da
corte que chegara ao país “desprovida” de seus bens, mas com a mesma pompa.
Hospedagens, vestuário, banquetes, festas, etc., praticamente tudo teria
passado a ser financiado à corte a partir de impostos cobrados das mais
distantes regiões do país. Dentre os impostos malvistos, o que se referia à
iluminação das ruas do Rio de Janeiro se destacou pela grande indignação
causada à época.
O favorecimento dos cidadãos lusitanos em detrimento dos
brasileiros também gerava bastante indignação por parte destes que se sentiam
insatisfeitos e perseguidos. Os cidadãos portugueses ocupavam os principais
postos de trabalho, seja na administração, seja no exército; os comerciantes
portugueses, por sua vez, detinham regalias que aumentavam consideravelmente
seus lucros.
Em Pernambuco, como em outras províncias, a insatisfação era
grande, mas em nenhum lugar a revolta foi tão contundente: desde a expulsão dos
holandeses, na Batalha dos Guararapes, em 1654, um ar de liberdade pairava
sobre a província pernambucana que procurava se guiar. “Enquanto entre El Rei e
os demais colonos prevaleceria uma sujeição natural, os pernambucanos manteriam
com a monarquia um vínculo consensual, ao se haverem libertado dos Países
Baixos mercê de uma guerra travada por seus próprios meios, havendo assim
retornado à suserania lusitana de livre e espontânea vontade”. (TRACCO, 2007,
p. 35)
Outros fatores decisivos foram as ideias vindas dos Estados
Unidos e da Europa e a Grande Seca de 1816. Pernambuco detinha uma das maiores
economias do Brasil e no seu porto, em Recife, mais do que mercadorias eram
trocadas: os ideais advindos da independência norte-americana (1776) e da
Revolução Francesa (1789) já eram objeto de discussão há tempo, principalmente
nas sociedades secretas que se proliferavam. “Já haviam chegado, desde o fim do
século XVIII, as sociedades secretas, como as lojas maçônicas. Em Pernambuco
existiam muitas delas, como a Patriotismo, Restauração, e Pernambuco do
Ocidente e do Oriente, que serviam como locais de discussão e difusão das
‘infames ideias francesas’”. (MULTIRIO, 2015, s/p)
Bênção das bandeiras da Revolução de 1817, de Antonio
Parreiras.
Bênção das bandeiras da Revolução de 1817, de Antonio Parreiras.
Em 1816, uma grande seca arrasou as exportações de algodão e
cana-de-açúcar de Pernambuco, ao passo que os impostos aumentavam trazendo
desgraça aos seus residentes. Quando os ideais iluministas se juntaram à
indignação diante dos impostos, o caldeirão revolucionário começou a ferver…
Deflagrada a Revolução Pernambucana
No início do mês de março de 1817, o português Manuel de
Carvalho Medeiros encaminhou uma denúncia sobre suposta conspiração a José da
Cruz Ferreira, o Ouvidor da Comarca do Sertão. Nos dias 4 e 5, Caetano Pinto de
Miranda Montenegro, então governante da província pernambucana, buscou de todas
as formas trazer o apoio da população afirmando que todos serviam ao mesmo
soberano, discursou falas heroicas ao exército e pôs os diversos fortes
recifenses em alerta geral.
Na manhã seguinte, dia 6 de março de 1817, Montenegro
expediu ordem de prisão para encarcerar os suspeitos da conspiração.
Acredita-se que ao menos 13 ordens de prisão foram expedidas, sendo as dos
civis concluídas. Contudo, quando diligenciadas as militares, o tiro saiu pela
culatra: o governador foi preso, alguns chefes militares mortos e a Revolução
Pernambucana deflagrada. Inicialmente, seria apenas Pernambuco, depois, todo o
Brasil deveria se livrar dos grilhões do governo português.
Interessante se enfatizar esta parte da revolução que, por
seu valor histórico, transcrevo as palavras do Past Grão Mestre da Grande Loja
Maçônica de Pernambuco, Francisco Bonato Pereira:
[O brigadeiro] Manoel Joaquim Barbosa de Castro, português
grosseiro, comandante do regimento de artilharia, para desempenhar a missão,
ordenou que os oficiais se reunissem à certa hora no quartel e na presença de
todos, insultou os oficiais, dizendo que os traidores se achavam no seu
regimento. Domingos Teotônio Jorge protestou e recebeu ordem de prisão. No
caminho da prisão no forte de Cinco Pontas, foi gritando: “traição! traição!”
(Era a senha da Revolução).
José de Barros Lima, o Leão Coroado, devido ao seu valor e
coragem, irou-se com o procedimento do general, censurando-o em público. E o
assassinato do brigadeiro entrou nos planos da revolta. Mais arrogante depois
da prisão Teotônio Jorge, Barbosa deu ordem de prisão a Barros Lima.
‘Pois morre, miserável!’ E de um ímpeto Leão coroado
arrancou da bainha a gloriosa espada que fez rebentar a revolução de 1817 e que
o Instituto guarda como relíquia, embebendo-a no peito do brigadeiro. Seu
camarada e denunciado José Mariano completou a obra tirando a vida do
comandante (…).” (PEREIRA, 2015, s/p, acréscimo nosso)
Logo no dia seguinte, dia 7, com direito à Lei Orgânica
(Constituição) promulgada, foi implantado o governo provisório composto por um
magistrado, um religioso, um militar, um comerciante e um fazendeiro: José
Lúcio de Mendonça (magistrado), padre João Ribeiro (clero), Domingos Teotônio
Jorge (militar), Domingos José Martins (comerciante) e Manuel Correia de Araújo
(senhor de engenho).
Derrubaram o governador e implantaram um novo governo,
decretando a extinção de impostos, a liberdade de imprensa e de religião e a
igualdade entre os cidadãos. A Lei Orgânica, publicada pelo governo republicano
à guisa de constituição, garantia a igualdade de direitos e de propriedade,
inclusive de escravos, o que tranquilizava a elite local, mas descontentava
alguns de seus líderes mais radicais, defensores do fim da escravidão”.
(VINCENTINO; DORIGO; 2002, p.31)
Emissários foram enviados à Argentina, Europa e aos Estados
Unidos, propondo acordos comerciais e pedindo reconhecimento. Uma bandeira foi
criada e foi difundido o costume de chamar os cidadãos de “patriotas”.
O entendimento mais delicado sobre como a Revolução
Pernambucana se pautaria implicava em seu próprio seio: Ao norte da
ex-província, os produtores de algodão eram receptivos aos novos ideais
políticos (muitos deles haviam estudado na Europa e nutriam os ideais
iluministas e da revolução Francesa); já ao sul, no entanto, predominavam os
decadentes e conservadores fazendeiros de cana-de-açúcar, os senhores de
engenho, cujo interesse era preservar o sistema colonial, pois o açúcar
pernambucano ainda tinha Portugal como principal freguês.
Diante dos tantos acontecimentos, a resposta de Dom João VI
foi rápida e enérgica: despachou tropas por terra do Rio de Janeiro e de
Salvador, a marinha portuguesa para bloquear e bombardear o porto e a costa
pernambucana e algumas expedições para adentrarem no interior nordestino.Os
revolucionários tentaram se defender por todos os meios, incluindo por meio de
uma feroz guerrilha, mas, sem recursos para tamanha pressão, a coroa portuguesa
retomou o controle: depois de 75 dias de liberdade sustentada por sangue, suor
e lágrimas, a República Pernambucana sucumbiu diante dos mosquetes imperiais.
Pós-Revolução Pernambucana
A Revolução Pernambucana de 1817 foi um movimento liderado
essencialmente por padres e militares, também conhecida como a Revolução dos
Padres (pelo grande envolvimento do clero). Os líderes foram os maçons Domingos
José Martins, Antônio Cruz (o Cabugá), José de Barros Martins (o Leão Coroado)
e os padres João Ribeiro e Miguelinho. Todos os seus líderes foram sumariamente
julgados e fuzilados Como castigo, as
terras de Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte foram tiradas do território
pernambucano e novos governantes nomeados.
Embora a Revolução Pernambucana tenha fracassado, profundas
marcas foram cravadas: de 1817 até 1824, Pernambuco continuou exercendo seu
instinto libertário dando início algum tempo depois ao que ficou conhecido como
a Confederação do Equador (1824) — dessa vez guerreando contra os abusos de Dom
Pedro I.
Posteriormente, Joaquim do Amor Divino Caneca, o Frei
Caneca, que mais tarde se tornaria mais um herói sumariamente fuzilado de outra
insurgência pernambucana — a Confederação do Equador —, declamou a Canção
Pernambucana, da qual, tristemente, apenas o seguinte trecho nos restou:
Cidadãos pernambucanos
Sigamos de Marte a lida;
É triste acabar no ócio,
Morrer pela Pátria é vida.
Quando a voz da Pátria chama
Tudo deve obedecer;
Por ela a morte é suave,
Por ela cumpre a morrer.
O patriota não morre
Vive além da eternidade
Sua glória, seu renome
São troféus da humanidade.”
A Revolução Pernambucana de 1817
Eudes Bezerra.
Professor André, queria saber se o senhor pode me indicar um livro para que eu possa estudar história de alagoas. Vejo dificuldades em encontrar tais materiais. Obrigado pelo ótimo conteúdo do Blog.
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