Arqueólogos realizam visita técnica a forte holandês descoberto em Porto Calvo

Mário Aloísio e Marcos Albuquerque inspecionam área na Ilha do Guedes
O superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Alagoas, arquiteto Mário Aloísio, anunciou, neste sábado (28), a construção de um parque histórico e de um museu arqueológico no Reduto Ilha do Guedes, em Porto Calvo. O primeiro passa para o projeto é restaurar o fortim de terra identificado pela pesquisa arqueológica sobre a movimentação e ocupação holandesa / ibérica do rio Manguaba no século XVII, entre os municípios de Porto Calvo e Porto de Pedras, na região Norte do Estado.
Pela manhã, o superintendente do Iphan e arqueólogos que realizaram a pesquisa fizeram uma visita técnica à área onde foi identificado o fortim, uma construção holandesa de 1640. O Reduto Ilha do Guedes é a única estrutura fortificada preservada, morfologicamente, no Estado de Alagoas, conforme o estudo.
Os fortes e redutos construídos em terra foram comuns ao longo dos séculos iniciais da colonização. Mas, praticamente desapareceram ao longo do tempo.
“Há poucos fortes de terra identificados no Brasil e tão bem conservados como esse. Aqui, ele foi edificado estrategicamente à margem do rio Manguaba, de modo que se algum barco fizesse a curva do rio, já encontraria a boca de fogo do fortim. Trata-se de uma descoberta importantíssima não só para a história de Porto Calvo, mas do Brasil e da Europa”, considerou o arqueólogo Marcos Albuquerque, que coordenou a pesquisa iniciada em 2013 e finalizada no ano passado.
Mário Aloísio e Marcos Albuquerque inspecionam área na Ilha do Guedes
O Rio Manguaba servia de “estrada maior” por onde circulavam as caixas de açúcar com destino à Europa. Seguiam em barcaças até Porto de Pedras e daí a portos maiores onde se concentrava o grosso do produto a ser “exportado”. O fortim ocupa uma área de 472,37 m² e possui quatro pontas, um fosso e a praça de armas.
“Foi constatada a quase inexistência da materialidade desta ocupação. Esta constatação estimulou nossa equipe a ir mais longe, a procurar vestígios, a pisar caminhos outrora utilizados pelas tropas, tanto holandesas como luso-brasileiras, a entender todos esses espaços que tendem a desaparecer fisicamente, como já desapareceram boa parte da história alagoana e brasileira”, relatou Albuquerque.
De acordo com a pesquisa do Iphan, o Reduto Ilha do Guedes foi também o provável acampamento do almirante Jan Lichthardt, que comandava as tropas holandesas ali instaladas.
Em Porto Calvo, entre  1637 e 1645, ocorreram cercos e refregas que alternaram a posse do lugar, até que a campanha conduzida pelo conde Maurício de Nassau, após batalha decisiva, o conquistou, expulsando as tropas ibero-brasileiras para a Bahia, até a Batalha dos Guararapes (1648 / 49), que pôs fim às ocupações holandesas no Brasil.
“Se para os portugueses a grande Batalha foi a de Guararapes, para os holandeses o grande triunfo aconteceu aqui, na área que compreende os municípios de Porto Calvo e Porto de Pedras”, destacou o superintendente do Iphan em Alagoas, citando as batalhas de Mata Redonda (Porto de Pedras) e Comandatuba (Porto Calvo).
 A pesquisa arqueológica identificou ainda outros dois fortins em Porto Calvo e ratificou a existência de uma fortificação portuguesa no Alto da Força, onde hoje se encontra instalado o Hospital Municipal São Sebastião.
Pesquisa arqueológica partiu da cartografia da época para a realização das sondagensPesquisa arqueológica partiu da cartografia da época para a realização das sondagens

O local também é conhecido como “Alto da Forca”, onde Domingos Fernandes Calabar foi morto por garroteamento e esquartejado pelos portugueses, acusado de traição. Segundo Mário Aloísio, a ideia é transferir o hospital para outra área e, em seu lugar, construir o Centro de Estudos Arqueológicos.
“Para tocar esses projetos, vamos em busca de recursos e de parcerias, uma delas será com o Centro Nacional de Arqueologia. O primeiro passo agora é restaurar o fortim da Ilha do Guedes”, afirmou Aloísio.
O superintendente do Iphan revelou, ainda, que a área onde foi identificado o fortim, na Ilha do Guedes, está em processo de doação ao município. À prefeitura, foi solicitada a proteção do terreno com a instalação de uma cerca com um raio de 80 metros.
A descoberta do forte foi mantida em sigilo desde o ano passado e sua existência só revelada durante o 1º Fórum de Arqueologia em Alagoas: Período Ibérico/Holandês, realizado na cidade de Penedo, esta semana. Teme-se que a descoberta atraia caçadores de tesouros ao local, o que provocaria danos irreparáveis ao sítio arqueológico.
Botijas
Albuquerque lembrou que muitos moradores da região sofrem da “Síndrome da Botija”, comportamento que surgiu com a descoberta de dois tesouros antigos em Maragogi (2004) e um em Japaratinga (2013). A maior parte das moedas antigas foram coletadas e vendidas clandestinamente pelos populares.
O arqueólogo, entretanto, fez questão de lembrar que no Reduto Ilha do Guedes não há nenhum tesouro a não ser o de valor histórico que é a própria edificação. Ele explica que, como os holandeses se renderam e deixaram o Brasil, tiveram tempo para levar tudo o que era de valor.
“Eles não iam deixar tesouros. Não faz sentido”, frisou o arqueólogo, observando que podem ser achados apenas resquícios da ocupação no entorno do forte, como objetos de uso corriqueiro da época e sem nenhum valor comercial.
O superintendente do Iphan informou, ainda, que vai manter contato com a Diretoria do Patrimônio Histórico e Cultural do Exército para que haja uma maior proteção aos sítios de uso militar identificados em Porto Calvo.

Pesquisa foi coordenada pelo arqueólogo Marcos Pesquisa foi coordenada pelo arqueólogo Marcos Albuquerque
O diretor municipal de Cultura, Adelmo Monteiro, classificou a descoberta do Reduto Ilha do Guedes como um marco para Porto Calvo e um capítulo importantíssimo da história do Brasil.
“Muitos turistas chegam ao município e vão ao Espaço Cultural em busca de informações daquele período histórico. Agora, teremos uma prova concreta para mostrarmos”, disse Monteiro, que coleciona relíquias como balas de canhão, espadas, fragmentos cerâmicos e patacões encontrados na região. Ele pretende expor todo o material no museu que será construído. Ainda segundo o diretor, a ideia é montar na cidade um roteiro turístico de visitação, passando pelas fortificações, os campos de batalha e a igreja de Nossa Senhora da Apresentação, datada de 1610 e tombada pelo Iphan. “Porto Calvo tem história pra contar, só faltava resgatá-la e isso está sendo feito agora”, finalizou Monteiro.


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