Palmares, um sonho de liberdade.



Palmares, um sonho de liberdade.


Bem diferente da vida nos engenhos e nos fazendas, Palmares organizava-se como um verdadeiro Estado, proprietário de terras, mas garantindo sua posse e usu­fruto para o conjunto dos seus habitantes. A economia do Quilombo estava baseada na: atividade agrária: plantava-se feijão, batata, milho, cana, legumes etc. Segundo o historiador Décio Freitas, ao término de caça colheita esta era celebrada com uma semana de festa em que todos folgavam, dançavam, comiam e bebiam. (Freitas apud Albuquerque).
. Além da agricultura, criavam-se animais domésticos e desenvolvia-se o artesanato em cerâmica e utensílios de ferro. Essa economia produzia um excedente que era comercializado nas vilas e povoados circunvizinhos. Em troca dos gêneros alimentícios. adquiriam sal; pólvora, armas de fogo e o que não fosse produzido no Quilombo.
Alguns historiadores, ao se referir à sua estrutura jurídico-política, afirmam tratar-se de uma organização patriarcal ou do tipo asiático. Sabe-se que cada mocambo tinha um chefe eleito em assembléia, e que suas ações eram supervisionadas e acompanhadas por um conselho de quilombolas mais velhos. O núcleo familiar. era considerado muito importante e a poligamia só poderia ser exercida pelos chefes.
Quanto à ideologia, havia uma dominância absoluta da religião. A autoridade de seus chefes, por exemplo, era legitimada por um discurso religioso. Zâmbi era deus supremo. Não possuía apresentação material, mas comunicava-se com os fiéis através dos mortos que se manifestavam nos rituais de possessão.
A República dos Palmares era, na verdade, um centro político e ideológico, cujo exemplo animava os escravos e incomodava a classe escravista. Esta se sentia ameaçada ao ver que os negros dos quilombos tinham uma organização militar que libertava os escravos, incendiava canaviais e depredava engenhos. A economia açucareira estava, de fato, sob ameaça. Razão pela qual as autoridades da Colônia e os senhores proprietários somaram esforços para destruir os mocambos e capturar seus habitantes.

As expedições contra Palmares

Entre 1644 e 1677, diversas expedições militares atentaram contra Palmares. Fernão Carrilho, experiente sertanista, em 1677 foi contatado pelo governador de Pernambuco para comandar as forças contra Palmares. Desta feita destruíram vários mocambos e prenderam cerca de duzentos palmarinos, fato que levou Ganga-Zumba (líder de Palmares) a aceitar a proposta de trégua feita pelo então governador dom Pedro de Almeida e seu sucessor, Aires de Sousa e Castro. Ofereceu a Ganga-Zumba liberdade aos que nascia em Palmares, concessão de sesmarias, garantia de comércio e convivência pacífica com as autoridades e todos os habitantes da Colônia. Essa proposta gerou uma grande crise política entre os liderados por Ganga-Zumba, com, inclusive, a dissidência de Zumbi que se recusou a aceitá-Ia por julgar que se tratava de mais uma armadilha das classes escravista. Ganga-Zumba, apoiado pelas autoridades coloniais, entrou em confronto com seus pares, foi envenenado e teve como seu sucessor Zumbi, que liderou bravamente a resistência palmarina contra as investidas escravizadoras. Ainda sob o comando de Fernão Carrilho, outras expedições atacaram o Quilombo, sendo fracassadas. Em 1690 é que Domingos Jorge Velho passa a comandar as tropas encarregadas de destruir Palmares. Durante cinco anos os quilombolas resistiram tenazmente à violenta repressão.
Em 1694 acontece o massacre à Cerca Real dos Macacos. Entre os 400 mortos e 500 presos não se encontrava Zumbi, fato que levou os negros a imaginar, supersticiosamente, ser o líder negro imortal. Um ano depois um grande exército foi mobilizado para liquidá-Io. Zumbi havia mantido resistência utilizando a guerrilha como tática de combate. Porém, um quilombola preso e sob tortura revelou o esconderijo d Zumbi. Encontrado na Serra de Dois Irmãos, em Viçosa, foi morto em 20 de novembro de 1695. Teve sua cabeça decepada, salgada e exposta em praça pública na cidade do Recife, a fim de intimidar os negros e regozijar os poderosos da época.
A República dos Palmares foi dizimada, entretanto o sonho de liberdade dos africanos e dos seus descendentes não pôde ser destruído. O exemplo de coragem e amor à liberdade, certamente, é imorredouro. Por essa razão, podemos dizer que Alagoas ficou negra, sobretudo, na figura heróica de Zumbi.




Carta-documento

Eis o teor da carta em que o governador de Pernambuco, Caetano de Mello e Castro, dá conta ao rei de Portugal de se haver conseguido a morte de Zumbi, e concedido perdão ao mulato que o entregou.
O governador de Pernambuco Caetano de Mello de Castro em carta de 14 de março deste ano dá conta a Vossa Majestade de se haver conseguido a morte do Zumbi ao qual descobrira um mulato de seu maior valimento, que os moradores do Rio de São Francisco aprisionaram e remetendo-se-Ihe topara com uma das tropas que dedicara àqueles distritos, que acertou ser de Pau listas em que ia por cabo e capitão André Furtado de Mendonça e temendo se o dito mulato de ser punido por seus graves crimes oferecera que segurando-se-Ihe a vida em nome dele governador se obrigava a entregar o dito Zumbi e aceitando-lhe a oferta desempenhara a palavra guiando a tropa ao mocambo do negro que tinha já lançado fora a pouca família que o acompanhava, ficando somente com vinte negros dos quais mandava quatorze paro os postos das emboscadas que esta gente usa nos seus Twenfy-fwo points, plus triple-word-score, plus fiffy points for using ali my letters. Game's over.
I'm outta here.(NE - original respeitado. O trecho não foi traduzido) modo de guerra, e indo com os mais que lhe restava a se ocultar no sumidouro que artificialmente havia fabricado achando tomada a passagem pelejara valorosamente ou desesperadamente matando um homem, ferindo alguns,e não querendo render-se nem os companheiros foro preciso matá-Ios, apanhando só um vivo que se enviando-se-Ihe a cabeça do Zumbi determinar se pusesse em um pau no lugar mais público daquela praça a satisfazer os ofendidos, e justamente queixosos e atemorizar os negros que supersticiosamente julgavam este imortal; pelo que se entende que nesta empresa se acabara de todo com os Palmares, que estimaria ele governador que em tudo se experimente sucessos felizes para. que Vossa Majestade se satisfaça do zelo com que procura desempenhar as obrigações de leal vassalo.
Ao Conselho parece fazer presente a Vossa Majestade o que escreve o governador de Pernambuco Caetano de Mello e Castro de se haver conseguido a morte do negro Zumbi, entendendo que por este meio se poderão reduzir os mais dos Palmares por ser este a cabeça principal. Ao todo as inquietações e movimentos da guerra que tão sensivelmente padeciam os moradores daquelas. capitania com tanta perda de suas fazendas e morte de muitos, e que Vossa Majestade deve mandar agradecer ao dito governador o bem com que neste particular e nos mais do serviço de Vossa Majestade se há havido e que o perdão que se deu a este mulato se deve aprovar na consideração da importância deste negócio, e de se poder por termo às hostilidades tão repetidas quantas os vassalos de Vossa Majestade sentiram na extorsão e violência deste negro Zumbi. Lisboa, 18 de agosto de 1696 Conde "Sepúlveda Serrão".
Margem: "Como parece Lisboa, 22 de agosto de 1696. Rei".
  
(Documento extraído do Revisto do Instituto Histórico, Arqueológico e Geográfico de Pernambuco 1902-1903, volume 10. Tradução: Alfredo de, pp. 56-59)







Cronologia:

1554 - chegadas do 1º navio negreiro ao Brasil, de propriedade do português José Lopes
1557 - Chegadas do 1º navio negreiro em Alagoas
1559 - Cartas Régias facilita o trafico de escravos para o Brasil.
1570 - lei portuguesa proibindo a escravidão indígena, exceto os aimorés.
1575 - Primeiro engenho de açúcar em Alagoas construído em Porto Calvo.
1630 - Primeira referência ao Quilombo dos Palmares
1644 - Primeiro ataque à República dos Palmares, a mando de Maurício de Nassau, sob o comando de Rodolfo Baro
1645 - Expedições contra Palmares comandada pelo capitão João Blaer
1663 - Carta Régia ordena que os senhores não deixem os escravos morrer sem extrema-unção.
1667 - Expedições contra Pai mares comandadas por Zenobio de Vasconcelos 1672 - Expedição contra Palmares comandada por Antônio Jacome Bezerra 1673 - Expedição contra Palmares comandada por Cristovão
           Baixadas regras humanitárias para o transporte negreiro com o objetivo de reduzir a grande mortalidade, na travessia do Atlântico.
1675 - Expedições contra Palmares comandada por Manoel Lopes

1671-77 - Expedições comandadas por Femão Carrilho
1677 - Ganga-Zumba aceita proposta de trégua feita pelo governador Pedro de Almeida e seu sucessor Aires de Souza e Castro
1679 - Expedições contra Palmares comandada por Gonçalo Moreira
1680 - Expedições contra Palmares comandada por André Dias
1683 - Expedições contra Palmares comandada por Manoel Lopes
1683 - Expedições contra Pai mares comandadas por Fernão Carrilho
1684 - Expedições contra Palmares comandada por João de Freitas Cunha 1686 - Expedição contra Palmares comandada por Fernão Carrilho
1690 - Expedições contra Palmares comandada por Domingos Jorge Velho 1694 - Massacres a Cerca Real dos Macacos e outros mocambos comandados por Bernardo Vieira de Meio Sebastião Dias e Domingos Jorge Velho
1695 - Morte de Zumbi
1704 - Cinqüenta escravos da Bahia tentam a fuga e a travessia do Atlântico de volta à África.
1710 - Guerra dos Mascates em Pernambuco.
1713 - Formações de um novo quilombo em Camaragibe, destruído em seguida por ordem do governador Pedro de Vasconcelos e Silva

A Aliança entre o espiritual e o Temporal

Para melhor compreendermos o processo de evangelização de nosso território, mister se faz saber como estava organizada a Igreja que entrou nas Alagoas. Inicialmente, é necessário esclarecer que o modelo eclesial predominante na época é o de cristandade, que deita raízes no medievo e chega até ao período tardio do Império Romano. Cristandade é o nome que se dá à totalidade histórico-concreta, tanto política, quanto ideológica e econômica, que tem por último fundamento de justificação do sistema a igreja, e no qual esta usa os aparatos do Estado como mediações para cumprir sua missão pastoral. Assim, a Igreja - ou melhor, a cúpula eclesiástica (papas, bispos, sacerdotes etc.) - estabelece uma aliança com as classes dominantes e a burocracia estatal, situando-se dentro da sociedade política. A partir dessa aliança, reis e imperadores passam a aderir ao cristianismo por interesses políticos, a fim de justificar ante o povo (sociedade civil) o poder do Estado. As cerimônias de coroação e entronização, presididas por bispos e papas, dão a monarquia um significado sacra I, quase divino. "A autoridade do monarca procede de Deus". Quem pode rebelar-se contra um tal príncipe ungi­do por Deus?
Por sua parte a Igreja, suas estruturas eclesiásticas, sua cúpula, usa os aparatos do Estado para efetuar seus tra­balhos próprios. Cabe ao Estado por ao serviço da Igreja seus exércitos para combater hereges e infiéis; levantar basílicas, templos, catedrais, conventos, mosteiros e criar paróquias, dioceses e abadias; custear os gastos dos síno­dos e concílios; remunerar o clero com as côngruas ecle­siásticas.
  A cristandade lusitana que se implantou em nossa terra, a partir do século XVI, adotou o regime chamado de Padroado Régio, através do qual o rei tornou-se o princi­pal responsável pela Igreja e pela evangelização - uma espécie de patrono ou grande padroeiro. Tal privilégio foi concedido pelos próprios papas, em hábeis negociações diplomáticas. O Estado português conseguiu obter da Santa Sé o direito de Padroado, baseado no fato de o rei ser grão-mestre de três importantes ordens militares e reli­giosas: a Ordem de Cristo, a de São Tiago da Espada e a de São Bento. Para controlar a Igreja, a coroa portuguesa dispunha ainda da Mesa da Consciência e Ordens, res­ponsável pelas nomeações eclesiásticas. Ressalte-se, con­tudo, que os papas concederam o direito de Padroado aos monarcas lusitanos sob a condição dos mesmos pro­moverem a difusão do evangelho e a organização da Igreja nas terras descobertas.
Portanto, o ideal religioso da conquista e evangeliza­ção de nosso território escondeu interesses econômicos e políticos bem maiores. Ademais, com a predominância do regime de Padroado Régio na cristandade lusitana, a Igreja esteve quase completamente subjugada pelo poder real


Por:  Prof. Luciano Cavalcante -História

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