Ganga Zumba de Cruz das Almas

Era uma vez um rei africano – Ganga Zumba o nome significando “Grande Filho do Senhor”. Talvez o nome fosse Ganazumba, “Grande Lorde”. Natural do Império do Kongo, o reino imemorial que se estendia desde o sudoeste da África até o centro-sul do Gabão, era filho da princesa Aqualtune e tio do herói Zumbi. Negro foragido, deixou a marca de grande estadista, liderando a república livre dos Palmares, no atual município de União dos Palmares, entre os anos de 1670 e 1678.
Era uma vez a Praça Ganga Zumba – o nome em homenagem ao rei do Congo e líder dos mocambos ou esconderijos palmarinos onde se refugiavam os escravos, seguindo a chamada “rota da liberdade” desde os engenhos de Porto Calvo, Porto de Pedras e Barra Grande (Maragogi) até o eldorado da Serra da Barriga. Na praça – incrustada na orla de Cruz das Almas, ali onde o Brasil se aproxima da África, podendo-se traçar, em linha reta, outra rota imaginária até o continente africano, até a capital de Angola, Luanda –, erguera-se no ano de 1984, sob a administração do prefeito José Bandeira, no governo Divaldo Suruagy, um monumento ao rei.
 A estátua, obra do artista pernambucano José Faustino – famoso à época por conta do trabalho que fizera no teatro ao ar livre de Nova Jerusalém e no Parque das Esculturas, em Pernambuco, juntamente com outros escultores, isso nos meados dos anos 1960 –, tornou-se símbolo do bairro e de um movimento primeiro de conscientização da nossa negritude palmarina e maceioense. Virou referência e foi festejada, na inauguração, não somente pelos governantes, mas, também, pelo príncipe dom Pedro Orleans de Bragança, descendente da princesa redentora, Isabel do Brasil (1846-1921), aquela que assinou a Leia Áurea, acabando definitivamente com a escravidão no País.

“A praça, assim como o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, fomos nós que reivindicamos”, intervém o dileto professor de História, Edson Moreira, pioneiro da luta antirracista neste nosso território dito caeté. “Soubemos de José Faustino, o ‘Cotó’, e o chamamos para esculpir, em pedra granito, a estátua do rei Ganga Zumba. Zumbi é um herói, o maior das Américas, e a estátua dele com o menino quilombola na Serra da Barriga também é obra de Faustino. Mas o rei é Ganga Zumba e dali da Cruz das Almas ele observava – voltou a fazê-lo agora, às vésperas do feriado do dia 20 – o distante continente africano e o oceano onde ocorria o tráfico de homens negros africanos. “Ali, naquele pedaço de mar, antes que fossem interceptados pela frota inglesa, que fazia o patrulhamento de navios negreiros portugueses, espanhóis e até americanos, os traficantes, para não serem presos em flagrante, lançavam ao mar pessoas subjugadas e acorrentadas”, faz lembrar o mestre.
 


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